segunda-feira, 18 de maio de 2009

ANTÔNIO MARIA

ANTÔNIO MARIA
Semira Adler Vainsencher
Pesquisadora da Fundação Joaquim Nabuco

No dia 17 de março de 1921, na rua da União, no Recife/Pernambuco, nascia Antônio Maria Araújo de Morais. Ele passou a sua infância entre o engenho do seu avô e o velho sobrado da cidade. Foi aluno do Colégio Marista e estudou, também, piano e francês. No final da adolescência, ele já era amigo de vários compositores, a exemplo de Fernando Lobo, Arlindo Gouveia e Hugo Gonçalves Ferreira (Hugo Peixa).

Antônio Maria enveredou pela boemia, passando a buscar os prazeres noturnos no Cabaré Imperial, bem como em um pequeno bar chamado Gambrínus.

Sendo filho e neto de usineiros e estudante de agronomia, ele foi estagiar na própria usina da família, como técnico de irrigação de cana-de-açúcar. Por sua vez, Antônio Maria vivenciou a divisão, a venda dos bens e a falência de seus familiares.

No tocante a esse assunto, ele esclarecia:

"Um dia amanhecemos pobres, nossos automóveis foram ser carros de praça, o veraneio da praia ficou para quando Deus desse bom tempo."

Em 1934, Antônio Maria era admitido na Rádio Clube de Pernambuco, como locutor e apresentador de programas musicais feitos com discos. E, em bem pouco tempo, o seu nome já se destacava ao lado de alguns profissionais ilustres da época, tais como Nelson Ferreira, José Renato, Mercedes Del Prado, Ziul Mattos, Hélio Peixoto e Aloísio Pimentel.

Antônio Maria viajou para o Rio de Janeiro em 1940, tendo ido trabalhar como locutor esportivo na Rádio Ipanema. Contudo, devido ao seu estilo peculiar de irradiar os jogos, logo acabou sendo dispensado do emprego.

Improvisava sambas com Fernando Lobo e freqüentava os bares cariocas. Como ele não conseguia um emprego no Rio, retornou ao Recife, indo trabalhar em jornais, produzir músicas para publicidade sendo, inclusive, locutor esportivo.

Em 1944, Antônio Maria se casou com Mariinha Gonçalves Ferreira, a irmã do seu amigo Hugo Peixa, e foi morar em Fortaleza. Nesta cidade, ele trabalhou, por quase um ano, na Rádio Clube do Ceará, graças aos esforços do seu amigo Fernando Lobo. No entanto, retornaria logo ao Rio de Janeiro, passando a exercer o cargo de diretor de produção da Rádio Tupi, além de publicar crônicas no periódico O Jornal.

Atuou também como jornalista no Diário Carioca, assinando a coluna A noite é grande; na Revista Manchete, com a coluna Pernoite, e nos jornais O Globo e Última Hora. Por trabalhar no horário noturno, muitos diziam que ele era um repórter das noites cariocas.

Por ser um indivíduo muito talentoso, Antônio Maria conseguiu ser admitido, como diretor de produção, na primeira televisão brasileira - a TV Tupi - no dia 20 de janeiro de 1951. Nessa televisão, ele exerceu inúmeras atividades: atuou na locução esportiva, nos jingles, nos roteiros dos espetáculos, no humorismo e na crônica.

Antônio Maria não tocava instrumento algum. Costumava cantarolar as músicas e fazer as letras na medida em que criava as melodias. O seu primeiro frevo intitulado Frevo no. 1 do Recife (trabalho integrante de uma série de cinco frevos), foi composto em 1951. Neste mesmo ano, ele criava o samba Querer bem, em parceria com Fernando Lobo.

O seu grande sucesso como compositor, entretanto, viria somente a partir de 1952, ano em que a cantora Nora Ney iria lançar o samba-canção Ninguém me ama, como também o samba-acalanto Menino grande, que Antônio Maria produzira em parceria com Fernando Lobo.

Em 1955, o compositor adquiria novas e importantes parcerias, a exemplo de Manezinho Araújo, Vinícius de Morais, Evaldo Gouveia, Moacir Silva, Paulo Soledade, Zacarias, Zé da Zilda, Pernambuco, Reinaldo Dias Leme, João Roberto Kelly e Luís Bonfá.

Na década de 1950, Antônio Maria iria compor com Vinícius de Morais os sambas Quando tu passas por mim e Dobrado de amor a São Paulo, ambos gravados por Aracy de Almeida. Ainda em parceria com aquele poeta, ele criava outra música: Bate, coração. E, com Zé da Zilda, produzia os sambas Não fiz nada, Meu contrabaixo e Não vá embora.

Ismael Neto representou um importante parceiro para Antônio Maria. Com ele, compôs Valsa de uma cidade, o choro lento Carioca, e o samba-canção Sei perder a canção da volta. Em 1959, comporiam Manhã de carnaval e Orfeu do carnaval, duas músicas que integraram a trilha sonora do filme Orfeu do carnaval.

Com Moacir Silva foram produzidas as músicas Vem hoje, Ninguém sabe de nós, Fique comigo e Quando ela se foi. Com o amigo e cunhado Luís Bonfá, Antônio Maria faria Cajueiro doce, Faça o que quiser e Canção da mulher amada.

As músicas Preconceito, Vou pra Paris e A noite é grande, Antônio Maria compôs com Fernando Lobo. Com o compositor Pernambuco, viria Concerto no céu, Dorme, Suas mãos, Desse amor melhor, Mais que a minha vida, Amor de janela, O amor e a rosa e Coisas do amor. Cajueiro doce, por sua vez, foi criada em parceria com Manezinho Araújo.

Antônio Maria compôs ainda muitas outras músicas: Frevo número dois do Recife, Frevo número três do Recife, Domingo, Fulana de Tal, Menino grande, Minha amada dormiu, Portão antigo, Recife, Canção da volta, Podem falar e Madrugada 3 e 5 (em parceria com Reinaldo Dias Leme), Dez noites, Parceria, O Rio amanhecendo, Sei perder e Ai! Que medo.

Entre os seus importantes intérpretes, pode-se destacar Dolores Duran, Ângela Maria, Nora Ney, Aracy de Almeida, Emilinha Borba, Elizeth Cardoso, Jamelão, Agostinho dos Santos, Dircinha Batista, Silvia Teles, Dóris Monteiro, e os pernambucanos Claudionor Germano e Luiz Bandeira.

Como uma peça pregada pelo destino, Antônio Maria - um ferrenho combatente do Golpe Militar de 1964 - faleceu no dia 15 de outubro desse mesmo ano, vítima de um enfarte.

Desde a sua morte, porém, o célebre compositor vem sendo reconhecido e homenageado. Em 1970, por exemplo, houve um espetáculo no Rio de Janeiro com Maria Betânia e Raul Cortês, apenas com as suas obras. Algumas biografias suas foram escritas e, em 1997, a cantora Marisa, Gata Mansa, gravou o CD Encontro com Antônio Maria, que reuniu catorze de suas músicas, entre as quais O amor e a rosa, Manhã de carnaval, Samba de Orfeu e A canção dos seus olhos.

Transcreve-se, abaixo, uma das mais belas composições de Antônio Maria: o Frevo no. 1 do Recife. Esta música foi composta quando ele morava no Rio de Janeiro.

Ô Ô saudade
Saudade tão grande
Saudade que eu sinto
Do Clube das Pás, do Vassouras
Passistas traçando tesouras
Das ruas repletas de lá
Batidas de bombos são maracatus retardados
Chegam da cidade cansados
Com seus estandartes no ar.
Que adianta se o Recife está longe
E a saudade é tão grande
Que eu até me embaraço
Parece que eu vejo Walfrido Cebola no passo
Haroldo, Mathias, Colaço
Recife está dentro de mim.

O parceiro e amigo Vinícius de Moraes, entre outras coisas, escreveria o seguinte no prefácio do livro O Jornal de Antônio Maria, cuja edição foi censurada e sustada pelos militares:

[...] Às vezes eu fico pensando. Não sei se você gostaria de estar vivo agora, meu Maria, depois de 1964. Tudo piorou muito, o Governo, o caráter, a música, perdeu-se aquela criatividade boa e gratuita da década de 50. Em resumo, Maria, não se perdeu a música; perdeu-se a sua dignidade.


Fontes consultadas:

ACERVO da Fonoteca da Fundação Joaquim Nabuco.

MARCONDES, Marcos Antônio (Org.). Enciclopédia da música brasileira: erudita, folclórica e popular. 2. ed. São Paulo: Art Editora, 1998.

A NOITE é grande: Antônio Maria. Encarte integrante do LP nº. PA 89.022.

No dia 17 de marçoo Gonçalves Ferreira (Hugo Peixa). Antônio Maria enveredou pela boemia, passando a buscar os prazeres noturnos no Cabaré Imperial, bem como em um pequeno bar chamado Gambrínus. Sendo filho e neto de usineiros e estudante de agronomia, ele foi estagiar na própria usina da família, como técnico de irrigação de cana-de-açúcar. Por sua vez, Antônio Maria vivenciou a divisão, a venda dos bens e a falência de seus familiares. No tocante a esse assunto, ele esclarecia: "Um dia amanhecemos pobres, nossos automóveis foram ser carros de praça, o veraneio da praia ficou para quando Deus desse bom tempo." Em 1934, Antônio Maria era admitido na Rádio Clube de Pernambuco, como locutor e apresentador de programas musicais feitos com discos. E, em bem pouco tempo, o seu nome já se destacava ao lado de alguns profissionais ilustres da época, tais como Nelson Ferreira, José Renato, Mercedes Del Prado, Ziul Mattos, Hélio Peixoto e Aloísio Pimentel. Antônio Maria viajou para o Rio de Janeiro em 1940, tendo ido trabalhar como locutor esportivo na Rádio Ipanema. Contudo, devido ao seu estilo peculiar de irradiar os jogos, logo acabou sendo dispensado do emprego. Improvisava sambas com Fernando Lobo e freqüentava os bares cariocas. Como ele não conseguia um emprego no Rio, retornou ao Recife, indo trabalhar em jornais, produzir músicas para publicidade sendo, inclusive, locutor esportivo. Em 1944, Antônio Maria se casou com Mariinha Gonçalves Ferreira, a irmã do seu amigo Hugo Peixa, e foi morar em Fortaleza. Nesta cidade, ele trabalhou, por quase um ano, na Rádio Clube do Ceará, graças aos esforços do seu amigo Fernando Lobo. No entanto, retornaria logo ao Rio de Janeiro, passando a exercer o cargo de diretor de produção da Rádio Tupi, além de publicar crônicas no periódico O Jornal. Atuou também como jornalista no Diário Carioca, assinando a coluna A noite é grande; na Revista Manchete, com a coluna Pernoite, e nos jornais O Globo e Última Hora. Por trabalhar no horário noturno, muitos diziam que ele era um repórter das noites cariocas. Por ser um indivíduo muito talentoso, Antônio Maria conseguiu ser admitido, como diretor de produção, na primeira televisão brasileira - a TV Tupi - no dia 20 de janeiro de 1951. Nessa televisão, ele exerceu inúmeras atividades: atuou na locução esportiva, nos jingles, nos roteiros dos espetáculos, no humorismo e na crônica. Antônio Maria não tocava instrumento algum. Costumava cantarolar as músicas e fazer as letras na medida em que criava as melodias. O seu primeiro frevo intitulado Frevo no. 1 do Recife (trabalho integrante de uma série de cinco frevos), foi composto em 1951. Neste mesmo ano, ele criava o samba Querer bem, em parceria com Fernando Lobo. O seu grande sucesso como compositor, entretanto, viria somente a partir de 1952, ano em que a cantora Nora Ney iria lançar o samba-canção Ninguém me ama, como também o samba-acalanto Menino grande, que Antônio Maria produzira em parceria com Fernando Lobo. Em 1955, o compositor adquiria novas e importantes parcerias, a exemplo de Manezinho Araújo, Vinícius de Morais, Evaldo Gouveia, Moacir Silva, Paulo Soledade, Zacarias, Zé da Zilda, Pernambuco, Reinaldo Dias Leme, João Roberto Kelly e Luís Bonfá. Na década de 1950, Antônio Maria iria compor com Vinícius de Morais os sambas Quando tu passas por mim e Dobrado de amor a São Paulo, ambos gravados por Aracy de Almeida. Ainda em parceria com aquele poeta, ele criava outra música: Bate, coração. E, com Zé da Zilda, produzia os sambas Não fiz nada, Meu contrabaixo e Não vá embora. Ismael Neto representou um importante parceiro para Antônio Maria. Com ele, compôs Valsa de uma cidade, o choro lento Carioca, e o samba-canção Sei perder a canção da volta. Em 1959, comporiam Manhã de carnaval e Orfeu do carnaval, duas músicas que integraram a trilha sonora do filme Orfeu do carnaval. Com Moacir Silva foram produzidas as músicas Vem hoje, Ninguém sabe de nós, Fique comigo e Quando ela se foi. Com o amigo e cunhado Luís Bonfá, Antônio Maria faria Cajueiro doce, Faça o que quiser e Canção da mulher amada. As músicas Preconceito, Vou pra Paris e A noite é grande, Antônio Maria compôs com Fernando Lobo. Com o compositor Pernambuco, viria Concerto no céu, Dorme, Suas mãos, Desse amor melhor, Mais que a minha vida, Amor de janela, O amor e a rosa e Coisas do amor. Cajueiro doce, por sua vez, foi criada em parceria com Manezinho Araújo. Antônio Maria compôs ainda muitas outras músicas: Frevo número dois do Recife, Frevo número três do Recife, Domingo, Fulana de Tal, Menino grande, Minha amada dormiu, Portão antigo, Recife, Canção da volta, Podem falar e Madrugada 3 e 5 (em parceria com Reinaldo Dias Leme), Dez noites, Parceria, O Rio amanhecendo, Sei perder e Ai! Que medo. Entre os seus importantes intérpretes, pode-se destacar Dolores Duran, Ângela Maria, Nora Ney, Aracy de Almeida, Emilinha Borba, Elizeth Cardoso, Jamelão, Agostinho dos Santos, Dircinha Batista, Silvia Teles, Dóris Monteiro, e os pernambucanos Claudionor Germano e Luiz Bandeira. Como uma peça pregada pelo destino, Antônio Maria - um ferrenho combatente do Golpe Militar de 1964 - faleceu no dia 15 de outubro desse mesmo ano, vítima de um enfarte. Desde a sua morte, porém, o célebre compositor vem sendo reconhecido e homenageado. Em 1970, por exemplo, houve um espetáculo no Rio de Janeiro com Maria Betânia e Raul Cortês, apenas com as suas obras. Algumas biografias suas foram escritas e, em 1997, a cantora Marisa, Gata Mansa, gravou o CD Encontro com Antônio Maria, que reuniu catorze de suas músicas, entre as quais O amor e a rosa, Manhã de carnaval, Samba de Orfeu e A canção dos seus olhos. Transcreve-se, abaixo, uma das mais belas composições de Antônio Maria: o Frevo no. 1 do Recife. Esta música foi composta quando ele morava no Rio de Janeiro. Ô Ô saudade Saudade tão grande Saudade que eu sinto Do Clube das Pás, do Vassouras Passistas traçando tesouras Das ruas repletas de lá Batidas de bombos são maracatus retardados Chegam da cidade cansados Com seus estandartes no ar. Que adianta se o Recife está longe E a saudade é tão grande Que eu até me embaraço Parece que eu vejo Walfrido Cebola no passo Haroldo, Mathias, Colaço Recife está dentro de mim. O parceiro e amigo Vinícius de Moraes, entre outras coisas, escreveria o seguinte no prefácio do livro O Jornal de Antônio Maria, cuja edição foi censurada e sustada pelos militares: [...] Às vezes eu fico pensando. Não sei se você gostaria de estar vivo agora, meu Maria, depois de 1964. Tudo piorou muito, o Governo, o caráter, a música, perdeu-se aquela criatividade boa e gratuita da década de 50. Em resumo, Maria, não se perdeu a música; perdeu-se a sua dignidade. Recife, 6 de abril de 2004. FONTES CONSULTADAS: ACERVO da Fonoteca da Fundação Joaquim Nabuco. MARCONDES, Marcos Antônio (Org.). Enciclopédia da música brasileira: erudita, folclórica e popular. 2. ed. São Paulo: Art Editora, 1998. A NOITE é grande: Antônio Maria. Encarte integrante do LP nº. PA 89.022. (Texto atualizado em 13 de setembro de 2007) Semira Adler Vainsencher semiraadler@gmail.com Pesquisadora da Fundação Joaquim Nabuco

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